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Afinal, o que
é que Francisco Fernandes Lopes fez por Olhão?!
(publicado n'O Olhanense a 15 de Março de 2007)
Pegando ainda na homenagem que foi feita a Francisco Fernandes Lopes no dia 27 de Outubro de 2006, na Recreativa Rica, por uma comissão liderada pela Dra. Maria Odete Leonardo, gostaria aqui de deixar por escrito as ideias-chave que eu, como representante da APOS, lá deixei na minha palestra.
Todos temos a ideia que Francisco Fernandes Lopes foi um génio enciclopédico, tendo deixado rasto em áreas do conhecimento tão diferentes como a História e a Música. Apesar desta ideia corrente, raramente se conhece a profundidade dos seus estudos e inventos, assim como um aspecto curioso, também pouco conhecido - o enorme impacto que o seu génio provocava noutros génios da época! Exemplos disto são as dedicatórias que Almada Negreiros lhe escreveu, bastante reveladoras:
Ele está, para mim, no meio da primeira fila dos que estão à frente disto tudo (1924).
Para o Fernando Lopes, matemático algarvio do séc. XX, o qual tornou os números musicais como convém à Poesia (1925).
Também poucos conhecem o teor das três cartas que Fernando Pessoa lhe dirigiu em 1919, onde o convida para um projecto de edição de uma revista sobre cultura portuguesa, dedicada a intelectuais estrangeiros. Para Fernando Pessoa, apenas Francisco Fernandes Lopes e mais uns poucos, (nunca referidos mas que seriam "[quase] numericamente ninguém"…), teriam os golpes de génio necessários para mostrar no estrangeiro a grandeza intelectual da cultura portuguesa!
No entanto, independentemente do génio individual do Mestre, como para muitos era conhecido, parece complicado responder à pergunta inicial: o que é que Francisco Fernandes Lopes fez por Olhão?!
Mas a resposta é simples: ele, tão só, pôs Olhão no mapa geográfico-cultural, não só a nível nacional como até internacional!
Através das suas actividades ele vendeu, como até hoje mais ninguém conseguiu, a imagem da sua terra, nas décadas de 1920 a 1960, como se ele, sozinho, fosse uma autêntica "secretaria de estado da cultura e turismo", apenas dedicada a Olhão.
É curioso notar que a ascensão e queda da imagem de Olhão em Portugal e no Mundo, coincide com a ascensão e queda da vida de Francisco Fernandes Lopes e, este paralelismo, talvez não seja pura coincidência…
Mais ninguém, como ele, percebeu o que distinguia Olhão de outros locais do Mundo, e o que tornava a sua vila original e merecedora de uma visita turística!
Mais ninguém, como ele, escreveu sobre Olhão e o seu património “cubista”…
Nessa época, vinham a sua casa muitas figuras intelectuais estrangeiras para o conhecer pessoalmente, e ele, servindo de cicerone, mostrava a sua vila cubista, a mais mourisca da Europa, como ele dizia, com as suas açoteias, mirantes e pangaios, que só existiam no norte de África e em Olhão.
Seria muito interessante estudar-se nos livros de viagem escritos por estrangeiros de visita a Portugal, no séc. XX, o número de referências relativas a Olhão, e a influência que Francisco Fernandes Lopes teve sobre elas. Num destes livros de viagens, Jacob Job, Director da Rádio Zurich, escreve (em alemão) um interessante artigo sobre Olhão, que aliás, se confunde com o próprio Francisco Fernandes Lopes:
Por mais paradoxal que pareça, uma das coisas notáveis de Faro é a vizinhança de Olhão e algo de muito interessante em Olhão é o velho Dr. Francisco Fernandes Lopes. [...] é um daqueles fenómenos com que dificilmente deparamos hoje em dia. [...] O Dr. Lopes é a glória de Olhão (Jakob Job - PORTUGAL, land der christusritter - Eugen Rentsch Verlag, Erlenbach- Zurich, 1951, Switzerland).
Efectivamente, Olhão e Francisco Fernandes Lopes confundem-se na primeira metade do séc. XX!
Parece não se dever a Francisco Fernandes Lopes a invenção do termo "Vila Cubista" para designar Olhão, mas foi ele sem dúvida que deu eco nacional e internacional a esta designação, nos anos de 1920 a 1960.
A APOS gostaria de agora continuar aquilo que Francisco Fernandes Lopes nos ensinou: Olhão tem algo de original – o seu património “cubista” – que é merecedor de ser vendido dentro do enquadramento do actual turismo global.
Também não esquecemos uma frase de Francisco Fernandes Lopes, escrita em 1945:
O que será Olhão no futuro, ninguém, nem nenhum plano de urbanização o poderá visionar. Não é impossível, porém, que a incompreensão teimosa e pretensiosa dos homens pouco esclarecidos lhe venha dar um carácter irreconhecível […] para a urbanizar banalmente, internacionalmente, descaracterizando-a.
António Paula Brito
(Presidente da APOS – Associação de Valorização do Património Cultural e ambiental de Olhão)