Doc. 87

 

[Carta do Bispo do Algarve ao Príncipe Regente][1]

 

SENHOR:

Com sumo gosto vou eu e todo o meu clero, fiéis vassalos de Vosssa Alteza Real, dar a Vossa Alteza Real os parabéns de ver-vos neste Algarve restabelecido de novo a Vossa Alteza Real no Régio Trono Português, que o inimigo astuto e traidor queria usurpar, e de que injustamente queria privar a Vossa Alteza Real. O povo de Olhão, e logo o desta Capital de Faro, levantou a voz e pegou das armas para sacudir o jugo tirânico; e uniformemente clamámos: “Viva o Príncipe Regente de Portugal Nosso Senhor! Viva a Real Casa de Bragança! Viva Portugal!”. O eco dos nossos vivas soou por todo o Algarve, que logo, a uma voz, se declarou fiel a Vossa Alteza Real. Assim o possa fazer tão bem a capital e mais províncias do Reino de Portugal! E queira Deus que possamos levar ao fim o bem que com o seu manifesto auxílio principiámos! O inimigo confesso e aterrado ou fugiu, ou ficou prisioneiro, como o seu General [Maurin]. Agora, como sei que a Junta provisional e interina do Governo, a quem preside o Conde Monteiro Mor [D. Francisco de Melo], manda um Deputado a dar esta fausta notícia a Vossa Alteza Real, que assim como o meu Cabido, todo o Clero deste Bispado (que todo pegou em armas para defesa da Religião e da Coroa) estamos cheios de sumo contentamento por termos de novo aclamado a Vossa Alteza Real por nosso legítimo Soberano, de que damos a Deus infinitas graças, como autor de todo o bem. E depois de adorarmos a Deus prostrados em espírito por terra, beijamos a Régia Mão de Vossa Alteza Real, e da Augusta Rainha, nossa Soberana, com a submissão de fiéis vassalos, e ficamos rogando a Deus que guarde a Vossa Alteza Real por muitos anos.

Faro, 2 de Julho de 1808.

Francisco, Bispo do Algarve

 

[1]       Do correio marítimo levado no caíque Bom Sucesso ao príncipe regente, foi este o único documento, à excepção da carta do Compromisso Marítimo de Olhão (documento anterior), que confirmava (ainda que só de passagem) que tinha sido em Olhão que se iniciara a revolta algarvia contra os franceses, e daí a sua importância. O Bispo do Algarve, D. Francisco Gomes de Avelar, apesar de na época de ocupação inimiga ter pactuado, supostamente constrangido, com os intrusos (como se pode extrair da pastoral de 21 de Maio, e do relatório de Lagarde de 25 de Maio, documentos anteriormente inseridos), tinha sido elegido para vice-presidente da Junta do Algarve mal esta se formara, tendo igualmente assumido a presidência interina do dito governo, na ausência do seu presidente, o conde de Castro Marim, que inicialmente se encontrava em Tavira e posteriormente partira ao comando de um exército de algarvios que se formou para ajudar o Alentejo a expulsar os franceses.

Transcrição e anotações de Edgar Cavaco