Excerto
Doc. 39
Edital
[Carta do Governo de Lisboa ao Governo do Algarve][1]
[...]
O patriotismo e os admiráveis esforços das Províncias de Portugal e Reino dos Algarves, auxiliados pelas valorosas tropas de Sua Majestade Britânica, abençoados e protegidos visivelmente pela Divina Omnipotência, expulsaram as tropas francesas. Removido assim o despotismo, pois que estas embaraçaram o exercício do Governo que o Príncipe Regente Nosso Senhor estabelecera pelo decreto e instruções de vinte e seis de Novembro passado, os governadores Francisco da Cunha Meneses e D. Francisco Xavier de Noronha, com assistência do secretário João António Salter de Mendonça, que se acham sem impedimento, convocaram o conde Monteiro-mor e D. Miguel Pereira Forjaz, substitutos do Governador ausente Marquês de Abrantes, e do secretário impedido conde de Sampaio, e todos continuaram no exercício das suas funções, suspensas desde o dia primeiro de Fevereiro.
Elegeram pelas faculdades do dito decreto e instruções em lugar dos governadores impedidos o Principal Castro o Pedro Breyner, o Marquês das Minas e o bispo do Porto, e mandam que tudo se trate, regule e determine na conformidade das leis e costumes observados até o dito dia primeiro de Fevereiro, sem a menor alteração.
Os Governadores, cheios de reconhecimento pelas incessantes fadigas e exemplar prudência com que V. Ex.ª e a Junta Provisional de que é presidente dirigiram toda a energia dos cidadãos e povos desse Reino para o único fim da Restauração da nossa liberdade e suave governo de Sua Alteza Real, dando com toda a desteridade e circunspeção as providências mais adequadas e saudáveis, têm no maior apreço tão relevante serviço, que muito louvam e agradecem, e o porão na presença de Sua Alteza Real com o respeitável nome de V. Ex.ª e os de todos os dignitários da dita Junta. E como os leais moradores de Olhão foram os primeiros em dar exemplo do seu patriotismo, proclamando a mesma liberdade e governo, merecendo por isso particular contemplação, os governadores em especialidade que lhes dão os devidos louvores e agradecimentos por tão assinalados serviços, que fizeram os ditos moradores de Olhão, muito beneméritos e dignos da Pátria; e mandam que a mesma Junta faça publicar esta [carta] por editais nessa cidade [de Faro], lugar de Olhão e mais partes onde convir, sendo também registrada nos livros da Câmara da referida cidade. O que participo a V. Ex.ª para que o faça presente aos mesmos deputados e assim o fiquem entendendo.
Deus guarde a Vossa Excelência.
Secretaria de Estado dos Negócios do Reino, em 20 de Setembro de 1808.
[…]
[1] Logo após a expulsão dos franceses de Portugal, o governo regente que tinha sido instituído por D. João voltou a constituir-se, sendo um dos governadores do país o conde de Castro Marim. Então, no dia 20 de Setembro e seguintes, João António Salter de Mendonça, Secretário de Estado dos Negócios do Reino, enviou várias cartas às Juntas Governativas que se tinham formado nas províncias portuguesas, felicitando os seus membros, e o povo em geral, pelos feitos que tinham protagonizado. Tais cartas deveriam ser afixadas publicamente em editais, para serem conhecidas por todos.
O que destaca desta carta remetida a D. Francisco Gomes de Avelar, Bispo do Algarve (que tinha tomado a posse da vice-presidência da Junta do Algarve mal esta se formou, mas passou a assumir a presidência interina quando o conde de Castro Marim rumou ao Alentejo chefiando o exército do Algarve) é o facto de se referir aos moradores de Olhão como os primeiros que deram o exemplo do patriotismo. Nem as duas cartas que o mesmo autor dirigiu à Junta do Porto e aos portuenses (cidade esta que se rebelara antes de Olhão, mas já depois da guarnição espanhola ter aprisionados os militares franceses que aí se encontravam) revelam tal primazia, o que aponta que esta lhe foi dada por ter sido o primeiro lugar do país a se ter enfrentado, na prática, contra os franceses.
Transcrição e anotações de Edgar Cavaco