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A PESCA (PESCA DA SARDINHA). A SARDINHA, O QUE É...?
Pela necessidade de maiores capturas de peixe, em especial da sardinha, por causa da incipiente indústria de conservas, os armadores foram para a pesca em movimento e adoptaram o processo de cerco americano.
Foram procurar o peixe ao longo da costa.
A princípio, em barcos a remos.
O processo de "cerco americano" consiste em cercar o cardume no sentido contrário ao seu movimento, por meio de uma rede que se coloca, ao ser lançada, na vertical, mercê de uma fiada contínua de chumbo posta num dos lados da rede (a que vai para baixo) e de bóias de cortiça no outro lado da rede (a que fica na superfície). Depois, acto contínuo, fechar-se o cilindro oco da rede por um cabo forte (a retenida) que circula dentro de argolas de bronze, junto ao chumbo, de modo a que o todo da arte forme um grande saco. Este saco é diminuído e trazido até mais à superfície para que o peixe possa ser "copejado" e transportado.
Esta rede tem de ser comprida e larga para que dê um bom o profundo cerco e, sendo assim, uma rede destas, de algodão, alcatroada, com muito chumbo e argolas de bronze, cabos grossos de esparto, é uma rede muito pesada para ser alada para bordo por poucos homens. Têm de ser bastantes e não menos de 20 homens.
Um barco para ser suficiente a este peso tem de ser grande, e era. Eram barcos grandes, pesados, abertos e movidos a remos pesados. Cada homem com o seu remo, eram 20 remos, para ir ao mar e voltar no mesmo dia. Não podiam ir muito longe na costa. O esforço era enorme e o rendimento dava para conservar a pobreza com que tinham nascido os pescadores.
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A pesca desta nossa amiga com barcos a remos era insuportável.
Os tripulantes destes barcos quase levavam 20 horas seguidas a trabalhar sem descanso. Ora com os remos nas mãos, ora com as redes. O descanso em terra era curto, apenas umas escassas horas no dia e voltavam. Era um esforço demasiado e a temporada não podia ser longa. Mesmo assim, chegavam a fazer boas pescarias de sardinha. Meu pai, que andou nesta vida, contou-me que uma vez, mesmo em frente da barra (a barra não era a actual, era uma barra natural em frente da ilha da Culatra, das casas) apanharam tanta sardinha que levaram o dia todo a copejá-la para bordo de barcos que estavam perto.
Galeão de cerco à vela
Desenho do Arq. Telmo Gomes, retirado do site da ANC
Mais tarde, para evitar as remadelas de Olhão para o oceano e vice-versa, apareceu um pequeno rebocador que levava os barcos até fora da barra. Foi o princípio do fim.
Foi o princípio dos galeões e o fim dos barcos a remos. Galeões são barcos de madeira ou ferro, movidos por máquinas a vapor, com cerca de 30 metros de comprido, de borda baixa e popa redonda.
Os galeões eram barcos pesados e muito carregados. Transportavam toda a tripulação, constituída por cerca de 30 homens e com tarimbas para se deitarem durante a procura do peixe pelos respectivos encarregados desse serviço. Carregavam a rede na popa que, em relação à que os barcos a remos usavam, foi aumentada. Devia pesar mais de l0 toneladas. Era como as outras de fio de algodão, tinturadas e alcatroadas. Deviam ter mais de 500 metros de comprimento por 60 a 70 de altura, todas chumbadas e argolas metálicas por onde passa o cabo grosso da retenida a obrigar a rede na água a tomar a posição vertical. Estes galeões a vapor eram providos na coberta, de um guincho com um sarilho movidos a vapor para puxar o cabo da retenida. O resto era à força do braço do homem.
Carregavam também o seu combustível para a formação do vapor de água na caldeira. Este combustível, constituído por hulha ou lenha, dava-lhe para um navego de pouco mais de 30 horas a uma velocidade de 6 a 7 milhas por hora. Saíam para a pesca de tarde, voltavam no dia seguinte de manhã ou até princípio da tarde.
Na tripulação havia homens especializados. O principal era o mestre de pesca. Só às ordens deste a rede se lançava ao mar. Havia o mestre de leme, que era o responsável pela navegação nos rumos dados pelo mestre de pesca. Havia o maquinista e l ou 2 fogueiros para alimentar a caldeira de combustível e verificar a pressão do vapor formado; o encarregado da aberta, o pedreiro, para localizar os afloramentos rochosos cobertos pela água; os moços da chata e os aladores de rede.
Estes barcos faziam l ou 2 lances por cada saída ao mar. Duma maneira geral o 1° lance era à noite e o 2° era ao romper do dia. De noite e noite escura, a sardinha em cardume vê-se melhor por causa da fosforescência que produz. Era um "mar de prata", diziam os pescadores ao referirem-se ao cardume que viram.
O peixe capturado nunca era transportado para terra pelos galeões. Quando do copejo, era lançado em barcos chamados buques, enviados pela mesma empresa ou por outra. Estes barcos, transportando o peixe, vinham para terra pelos seus próprios meios (à vela ou a motor) ou o próprio galeão trazia-os de reboque.
Vinha para terra o sangue e a vida de Olhão.
Logo de manhã muito cedo tudo se animava. O peixe vinha chegando à lota. O cortejo na Ria, constituído pelos barcos que navegavam nos canais, transportando a seiva que o mar nos oferecia, tinha o não sei quê de empolgante.
A alegria de felicidade era comunicativa: Todos partilhavam dela, mesmo aqueles que, directamente nada lucravam com a bênção do mar.
E quando os galeões vinham chegando com l, 2 e 3 e mais barcos de reboque cheios de sardinhas, apitavam antes de chegarem ao seu ancoradouro, passando em frente das Praças, era emocionante. Sabia-se da alegria daqueles homens que trabalharam a noite inteira.
Retirado de:
Barbosa, José - Visto e ouvido... em Olhão... reflexões - Câmara Municipal de Olhão, 1993, pp. 107-113